domingo, 29 de setembro de 2013

NÃO TEMO

Não pensem que temo o tiro pela culatra,
Pois passar o tempo à espera
De ouvir o baque do gatilho
Sem que apenas um dedo se mova,
Já causa tanta náusea,
Que pela culatra ou pelo cano
o importante é ouvir o pum!
Quando o fim não é aparente,
Apenas uma realidade protelada,
Venha ele como vier,
Que é um fim sempre bem acolhido.

Mais vale a dor do obscuro
Do que a vivência do nada.


De Maria La—Salete Sá (12/01/1990  32:30h)

DECIDIR VIVER…



Está dividido o meu sentimento
no amor e na amizade,
alterada a racionalidade
na decisão definitiva.
Desprender as raízes de uma vida que deu seiva
é doloroso,
olhar em frente e esquecer o passado
é impossível,
racionalizar a emotividade de uma vida
não é fácil,
não é nada fácil…,
Mas há que desenterrar raízes,
há que viver…

De Maria La-Salete Sá (Junho de 1992)


É HORA…



É hora
de olhar para trás,
rever o tempo perdido,
o tempo não vivido…
é hora de recuperar,
não vá a hora chegar,
a hora de cobrar
o tempo que passei pela vida,
o tempo sem viver…
É hora de parar,
é hora de recrutar forças,
é hora de partir para a vida,
é hora de recomeçar.

De Maria La-Salete Sá (24/10/1989)


RE(DESCOBRINDO)



Descubro-me criança
a germinar no sonho
no crescer da fantasia.

Descubro-me mulher,
fruto amadurecido
na aprendizagem da vida.

Descubro uma aprendizagem
feita de caminhadas,
de dores e de alegrias.

Sou criança, sou mulher,
seja o que for,
seja o que quiser,
SOU.


De Maria La-Salete Sá (15/05/1996)

DA MINHA MÃE


Vou partilhar umas quadras que a minha mãe escreveu, penso que no dia em que o meu filho mais velho completou 18 anos, longe do pai (porque já estávamos divorciados).

A mãe é a rosa mais sublime
que no jardim se criou
é o carinho e o abrigo dos filhos
que Deus ao mundo botou.

Tendes um pai de longe
mas uma mãe de perto
para vocês, filhos,
está sempre de coração aberto.

Ricardo meu neto
entraste na maior idade
fico pedindo a Deus
pela tua felicidade.

Que Deus te guie
no caminho direito
para que haja amor
paz e respeito.

Pedro Maurício
meu neto adorado
que sejas protegido
e por Deus abençoado.

Os meus parabéns
dos avós queridos
para que no mundo
sejais protegidos.

De Maria Francisca, minha mãe.


JÁ NÃO ÉS…



Já  não és a obsessão-desejo
que  perseguia o meu desespero
de estar só,
de querer-te sem querer…

Já não és o sonho impossível
que despertou o meu sentimento
para uma entrega sem limites…

Já não és o pesadelo
que torturava a minha ilusão
nesta casa, castelo assombrado. Sem amor…

Já não és o grito de angústia
que ecoava no meu silêncio
a revolta-negação dos teus afagos…

Já não és… Bem hajas tu, bem haja eu!
não és barreira, não és limite,
não és caos, não és abismo… para mim…

Já não és!

És apenas – e tanto que és! – o amigo,
a ternura da partilha,
o sofrimento incontido da tua dor no meu peito,
o desespero de não poder anular o que está feito,
a vontade imensa de querer ajudar
sem saber ao certo onde começar…

Ah!, meu amigo! Tu já não és,
Tu és!
E porque és, assim amigo, assim irmão,
o espinho da tua ferida
fere-me a alma
e o coração…

De Maria La-Salete Sá (20/12/1986   01:09h)


DESNORTE…



Como me sinto desnorteada
no meio de tanta injustiça!
Como me sinto insignificante
longe de ti, amor!
Como me sinto tão só
por ver perdida uma recordação tão amada!
Como me sinto tão triste
por não te ter a participar da minha amargura!
Sou tão pequena
nesta imensidão humana
e necessito de ti, amor
para não sucumbir,
para crescer, viver e ainda ser feliz…

De Maria La-Salete Sá (21/06/1976  quatro meses após o falecimento da minha filha…)


PARTIDAS DA VIDA…



Ah! Vida! Porque és assim?
Porque me obrigas a ser como sou?
Porque obrigas o justo e o inocente
a pagar as faltas que não lhes pertencem?
Ah!, como tu às vezes és tão cruel
apesar de tão bela!---
Como tu pregas partidas
mesmo sendo meiga!...
Ah! Se eu pudesse mudar!
Se eu pudesse construir-te toda e sempre bela…
mas tu não deixas…
A cada esquina, a cada dia,
no momento mais inesperado
resolves pregar-nos uma partida!
Mas és bela apesar de tudo,
e, apesar de dura, por vezes,
eu adoro-te.
Adoro-te, embora também sinta
(como todos sentem)
o ensejo de me evadir,
o ensejo de brincar contigo
como tu brincas connosco!
Mas também sou consciente,
mesmo fracassando,
tento procurar o teu sorriso,
mesmo com raiva e desejo de te mandar à merda,
tento seguir de cabeça erguida
e rir-me de ti,
rir-me de mim,
rir para ti,
minha vida cruel e adorada.
Eu amo-te, vida!
Amo-te porque em ti,
de ti faz parte tudo o que tenho,
tudo o que sou…
Em ti vivo,
em ti confio,
em ti encontro tudo o que há de bom…
Mas também me dás o menos bom,
apesar de me mostrares e dares maravilhas…
E é por isso que te quero,
mesmo com o teu mais sombrio semblante.
Quero-te vida, ensina-me sempre
a ver a luz onde tudo parece um mundo de trevas,
não me deixes presa na escuridão
porque assim,
mesmo vivente,
morreria…

De Maria La-Salete Sá  (21/06/1976 fez quatro meses que perdi a minha filha…)


PSICOGRAFADO?! NÃO SEI…



Quero-te.
Não só te desejo, mas amo-te.
E sei que é impossível este amor, este querer
quero, sobretudo, retomar a tua amizade

Continua amargurada a minha vida,
oprimido e instável,
desventurado pelo destino,
perdido na vida…

Gostava de falar contigo
como nos velhos tempos.

De Maria La-Salete Sá

(Não tem data este poema, no pedaço de papel onde o escrevi apenas havia a seguinte nota: Mensagem telepática? telecaneta?

Mas lembro-me de o ter escrito, de o ter sentido como que “a sair do nada”, como se uma força desconhecida me impulsionasse a escrevê-lo, sem que saiba “quem mo ditou”) 

TEIMOSA LETARGIA…




Está obscurecido o dia
E um letargo teimoso se encostou a mim…
Sonolenta me debato
entre o reagir
ou cair na letargia.
O aqui e o agora reclamam que devo reagir,
que há tarefas a cumprir,
o atemporal sussurra baixinho
que devo dormir, deixar o corpo e fluir
à procura do que o infinito
tem para me dar a conhecer,
a procurar…
Mas hoje não posso.
É o hoje. O aqui e o agora.
o terreno, a vida visível,
as tarefas, o tempo, o espaço…

Sei que me perco. Mas é urgente que desperte.
Outros dias virão,
outros letargos surgirão…
E é com pena e um laivo de tristeza que dispo
e me despeço
destas asas que me queriam levar a voar…

De Maria La-Salete Sá (07/10/1990  16:20h)



GRITOS DE SILÊNCIO




As palavras deste silêncio que me sufoca
gritam dores, espasmam tormentas
fechadas como estão no parar do tempo…
As palavras deste silêncio
encerradas numa boca de lábios selados
atropelam-se e maltratam-se
no ímpeto de largar em desfilada
tal corcel fogoso e bravio
à procura do prado universal
onde se espraiar.
As palavras gritantes deste silêncio
martelam meu cérebro dormente
prestes a explodir
à força da sua voz
tão silenciada de tão contida…

De Maria La-Salete Sá (20/04/1990   23:00h)


CONVULSIVA EXPLOSÃO



Explode meu ser num frémito imenso
que não consigo reter
as convulsões deste sentimento…
Minhas entranhas rebentam
na ânsia convulsionada deste sufoco
feita de revolta, de dor…
Não é tédio nem desamor,
é o ser eu sem que o possa ser,
é o reter bem no fundo deste poço que sou eu
toda a fúria de querer viver
sem o poder.
É o calar sem o querer,
é o morrer sem pestanejar,
é a guerra do meu íntimo
a querer explodir
sem me deixar calar…

Explode meu íntimo no frémito imenso
deste constante calar do pensamento.

De Maria La-Salete Sá (22/04/1989   00:11h)



PERCURSOS…



Eu fui obra traçada do destino
e sou a linha constante da vida.
Fui escrava, algures, em tempo indeterminado,
açoitada pelas mãos e ordens do senhor poderoso.
Fui homem vil, duma tirania incontestável,
talvez lutando em prol da fé na Guerra Santa.
Combati homens como se foram feras,
tiranizei e reduzi a répteis
pessoas de bom coração.
Fui leal servidor, fui justiça e tirania,
fui homem e mulher
em tempos e locais ilimitados e inexplícitos.
Hoje sou mulher sem medo de fantasmas nem de dragões
a cumprir este carma atribulado
a que me impus.

De  Maria La-Salete Sá (12/12/1988)



FUGA DE MIM




Hoje o meu  espírito tem necessidade de evasão,
de procurar refúgio noutras galáxias,
noutros povos, noutros seres,
noutras civilizações.
Hoje quero progredir para o além mundo
ou para o prefácio desta existência.
Hoje quero fugir deste corpo,
deambular apenas presa pelo perispírito
e entrar no Cosmos,
no povoamento de seres informes
mas reais,
daqueles que são mais do que mais,
que são os próprios, os Eus,
como em espírito eu também sou Eu.
Quero deixar a Terra,
esvair-me de mim mesma,
deste ser material que sou,
deixar de ser matéria
e ser o nada,
porque este nada é o tudo.
Hoje quero ir além, ultrapassar limites e fronteiras,
fluir entre barreiras
e encontrar-te e contigo poder falar…

… contigo que és Eu.


De Maria La-Salete Sá (21/04/1989  00:01h)






Porque vives eternamente camuflado
de bem casado
e bom cidadão?
Porque te temes mais do que temes o que julgas temer?
Porque te consideras superpotente,
se essa superpotência
não passa de uma alienação de ti mesmo?
Porquê tanto pavor em enfrentares a tua realidade?
Não vês que estás a fragmentar a tua personalidade?
É altura de te cimentares,
de criares as tuas próprias estruturas
e os teus alicerces,
é hora de te olhares e de te reconheceres,
de te interrogares para saber
e compreender que já é tempo de crescer.

Se olhares bem – e de olhar bem atento –
para dentro de ti,
para a tua essência, para a tua alma,
poderás descobrir em quantos fragmentos te tornaste,
descobrir que o teu embrião não cresceu por igual.

Vê o “tu” que está adulto e o “tu” que se recusa a crescer,
Vê!


De Maria La-Salete Sá ( setembro de 1988)




TEMPESTADE D’ALMA



Se a raiva que se instalou neste espírito
fosse passível de incendiar-se
com ela explodiria o universo,
tal guerra das estrelas em colisão.

Se esta fúria que surgiu não sei de onde
conseguisse soprar a sua força,
tornados, tsunamis e ciclones
sacudiriam o planeta.

Mas esta fúria, esta raiva,
esta revolta consumada
apenas eclodem no meu íntimo
e toda eu sou…
…um complexo de galáxias em explosão.

De Maria La-Salete Sá ( agosto de 1989)


GOSTO ACRE



Hoje a vida tem um gosto acre
E um cheiro nauseabundo.
São ecos vindos doutros mundos
Que me contrariam a razão,
são subtilezas que se sentem e vivem
mas que não podem ser provadas,
são certezas
de certezas improvadas…

Hoje a vida tem um gosto acre
que me chega ao coração,
um cheiro nauseabundo
que reclama interiorização,
mas o meu consciente cansado
quer fugir ao designado,
quer dormir, ficar parado
na quietude da não-aceitação.

Hoje estou só. Desolada e incompreendida,
queria ser só matéria vegetativa
sem pensar no meu “eu infinito”.
Debato-me com o espírito
que reclama a compreensão
mas eu, a mulher dos sentidos
queria abolir (por momentos) o dever
da caridade e abnegação…

De Maria La-Salete Sá (18/02/1989  00:40h)



QUE DESABE…




Que a atmosfera pesada e quente
desta noite de verão,
prestes a abrir-se sobre mim,
desabe em todo o universo.
Queria sentir-me arrancada deste sufoco,
acossada pelo uivo da tempestade furiosa
e alagada pela chuva que não vem…
Queria…
Queria que esta atmosfera pesada e quente
ribombe e rebente sobre mim a sua fúria…

Talvez, então, eu também consiga
atirar para o mundo
o temporal que trago cá dentro.

De Maria La-Salete Sá (22/07/1990  01:31h)


INADAPTADA



Parada no tempo sem tempo em que estou
questiono os porquês desta razão
sem resposta racional...
Não há quês nem senãos,
apenas o desejo da projeção
do meu espírito etéreo
sem barreiras, sem fronteiras, sem parâmetros dimensionais.
Agora sou maior do que o espaço universal
ou mais ínfima do que o infinitésimo do mínimo.
Sou o tudo e sou o nada.
Contraponho-me e contradigo-me
Na correria louca em busca do sonho…
Ele lá… eu aqui.
De nada me serve, pois, a grandeza ultra dimensional
nem a pequenez infinitesimal…
Ser o tudo ou ser o nada – razão irracional -,
utopia-contradição, vontade anulada,
(o tudo ou o nada??!...)
Não! Cercam- se-me as fileiras
dos meus cavalos alados,
grito-me bem de dentro
que apenas sou, sem tudo, sem nada,
mulher incongruente, mas consciente
duma vida inadaptada.


De Maria La-Salete Sá (22/07/1990  01:25h)

PIEDOSA MENTIRA



Pressinto que me afundo de novo em incertezas...
Começa a desmoronar-se a estrutura do meu pedestal,
do pedestal onde me ergui
alta e inflexível,
dura que nem uma rocha...

O cimento armado
em que me alicercei
começa a diluir-se
no paradoxo deste sentir incongruente...
E, a pouco e pouco,
sinto-me reduzida a nada
no mundo das emoções.

Já não sou a mulher super-segura de si mesma,
a auto-suficiente,
sou a criança carente
perdida no abismo
em busca duma mão amiga,
dum carinho,dum afago...
Sou a fragilizada
na vulnerabilidade inconstante do ser...

A solidão dum mundo inteiro
pesa sobre os meus ombros
e uma asfixia crescente
desperta-me cada vez mais
a vontade de gritar contra o silêncio...

E ri-se de mim a lua! Lá fora... pequena e insignificante
no seu quarto crescente...,
dentes abertos  num sorriso de desdém
como quem apregoa
a sua influência cíclica na vida de alguém!
Hoje esse alguém sou eu.
Sou eu que caí do astro-rei,
caí mais baixo do que o satélite mais ínfimo...
nem meteoro fui, apenas em areia me tornei...
...fina e frágil...

Mas não pposso  permanecer assim!
Com areia (e cimento) se constroem torres e castelos,
Se erguem fortalezas,
Com areia (e cimento)
Se fabricam cidades, se fazem mundos.

Eu hei de voltar a crescer,
voltar a vencer,
voltar a ser!

Talvez amanhã entre de novo em derrocada,
mas preciso de força para erguer-me AGORA...
Cimento e lágrimas darão consistência de rocha
à areia que hoje sou.
Urge reconstruir-me, capacitar-me e convencer-me
que as negações às emoções primárias
não são mais do que idealizações
de pessoas fracas... insignificantes...

E nesta insignificância de mentira piedosa
reestruturo a fortificação,
restauro a fortaleza
do meu castelo de cristal...

... e enquanto não surgir outro temporal/emocional
Ficar-me-ei no meu pedestal.


De Maria La-Salete Sá


Maio de 1990